Tem algumas coisas em
nossa vida que precisamos passar, para amadurecermos e tirar daquele momento
difícil alguma lição.
Cedo passei por uma
grande provação – mudar não só de casa, mas de cidade também.
Lembro-me com tristeza
de despedir de cada cômodo da casa onde morávamos, lá pelos meados do começo da
década de 70, em Araguari, Minas Gerais... Ainda criança, uns nove anos...
Ficava na Rua Jaime Gomes. A casa era simples e tinha vários cômodos, quatro
quartos grandes, uma sala espaçosa, banheiro social e banheiro na suíte,
cozinha e copa juntas, dispensa com lavabo, quartinho na área externa com
banheiro para empregada. Um quintal com uma mangueira maravilhosa, um
galinheiro construído por meu pai, confortável, com piso elevado, casinha de
botar ovos, cocheiro de água e ração... Dentro um piso era forrado de palha
seca que era sempre trocado. Havia três balanças no quintal, uma para cada
filho. Eu me despedia de tudo com olhar comprido, sabendo que não mais
aproveitaria aqueles espaços.
As galinhas papai havia
doado para alguém cuidar, acho que minha Tia da fazenda...
Minha mãe colocou quase
todos os brinquedos, meus e dos meus irmãos, na porta de casa, fazendo uma
montanha com eles. E pouco a pouco, vi meninos e meninas carregando minhas
preciosidades... O que mais senti, foi ver minha boneca que ria a Gui-Gui ser
levada sem dó...
Coisas materiais até
que a gente vai acostumando com o tempo. Mas, o que realmente me cortava o
coração é ter que deixar minhas amizades. Amizades de brincadeiras, de
pique-esconde, de teatro, de desfile. De brigas, algumas que marcaram uma amiga
com uma enorme cicatriz... Disputa de calçada. Outra amiga, com pontaria certeira,
do outro lado da rua, pegou uma pedra solta na calçada, quadrada, do tamanho da
mão fechada. Jogou... E acertou bem na cabeça... Vários pontos... Uma culpa por
incentivar a menina da pontaria a acertar a outra que também era nossa amiga...
Mas o perdão veio de forma inusitada.
Vendo o caminhão de
mudanças, todo repleto de nossos tesouros, móveis, brinquedos, bicicletas,
eletrodomésticos... Tudo ali, bem apertado e pronto para ir.
Não sabia que minhas
amigas, três de coração, haviam colocado em meio de roupas e gavetas alguns
bilhetes inesperados.
Ao chegar à nova
cidade, Uberlândia, lentamente colocando todos os objetos nos novos lugares, na
nova casa. Minha mãe me chama e entrega os bilhetes.
Cada um do seu jeito,
dizendo em poucas palavras, que não esqueceriam jamais de mim, e eu era uma
amiga especial. Até mesmo minha amiga que levou os pontos...
Acho que chorei por três
anos seguidos. Até conhecer novas amizades. E minhas amigas? As encontrei
depois, visitando minha rua antiga por algumas vezes. E agora, depois de muitos
anos, as encontrei, cada uma na sua vida, com filhos, com suas profissões... A
amiga da pedrada uma fisioterapeuta maravilhosa, pedi perdão novamente pelas
proezas da pedrada... A outra uma professora de faculdade, não a reconheci,
porque quando era pequena, tinha grandes bochechas, e ficou uma moça muito
elegante, sem bochechas... E a mais nova, Engenheira Civil, tem uma filha
adorável, que parece muito com sua irmã, a professora de faculdade, quando era
pequena.
A mudança foi dolorida,
mas necessária. E dela tirei o valor de verdadeiras amizades de uma infância
feliz.
Nenhum comentário:
Postar um comentário